"UMAS & OUTRAS" #20

Nota do Blog: Mestre Joca tirou férias – mais que merecidas, aliás – mas a coluna continua com algumas matérias de seu inesgotável baú. Aqui um ensaio sobre um de seus ídolos, o piloto francês Jean Pierre Beltoise.

É PROIBIDO MORRER*
Joaquim Lopes Filho

Jean Pierre Beltoise foi talvez o principal piloto francês da primeira metade dos anos 60, em meio a uma geração que então se prenunciava brilhante: Henri Pescarolo, Johnny Servoz Gavin, Roby Weber, Eric Offenstadt, Jean Pierre Jaussaud, François Mazet…
Sua trajetória é bem característica do que era ser um piloto de competições nos anos sessenta, quando o desenvolvimento dos carros e conseqüente aumento da velocidade, aliado á pouca segurança de velhos circuitos, os faziam morrer como moscas.
Era um tempo em que, devido à falta de altos salários ou patrocínios, os pilotos eram obrigados a participar de várias categorias como F-3, F-2, Esporte-Protótipos e Turismo, além da Formula Um para aqueles felizardos que já tivessem alcançado a categoria maior.
Assim, aumentavam as possibilidades de êxito, ao mesmo tempo em que os de acidentes mortais.
J. P. Beltoise iniciou-se nas motos, conseguindo 11 títulos nacionais em quatro categorias: 125, 175, 250 e 750 cc. Pilotou Morini, Bultaco, Aermacchi e Matchless, conseguindo em 1962 no circuito de Monthléry um feito inédito: num só fim de semana venceu quatro provas diferentes em motos distintas – 125, 175, 250 e 750 cc.!!

Beltoise e sua Morini 175 cc, em 1962

Seu enorme sucesso nas motos o levou a ser convidado por Renné Bonnet para pilotar as berlinetas Bonnet-Renault, já no final de 1963.
Nas 12 Horas de Reims de 1964 sofre terrível acidente ao rodar em uma mancha de óleo e o carro espatifar-se fora da pista, pegando fogo. Beltoise escaparia milagrosamente ao ser jogado fora do carro, mas com sérios ferimentos. Operado, perde o movimento do cotovelo esquerdo e, a seu pedido, os médicos imobilizam o braço em um ângulo que o permitissem a voltar a pilotar.

Ao volante da sua Renné Bonnet…

…e o que sobrou do seu terrível acidente em Reims,1964

Depois de dez meses de lenta recuperação e, a despeito dos ferimentos, é convidado por Jean –Luc Lagardére a integrar o programa de F-3 da Matra Sports, que iniciava nas competições.
Volta a correr no inicio de 1965 e vinga-se de Reims ao conseguir neste circuito a primeira vitória da Matra em F-3, pouco mais de um ano de ter sido dado como morto na mesma pista, sagrando-se ainda campeão francês neste ano e quarto no campeonato europeu, com um cartel de sete vitórias.

Primeira vitória da Matra na F-3, Reims,1965

Passa também a integrar o Team 1 da Matra – a partir de 1966 – no programa de Sport-Protótipos para Le Mans, desenvolvendo inicialmente o Matra-BRM 2 litros, juntamente com Servoz Gavin, Jaussaud e Pescarolo; depois os MatraMS 630, 640 e 650, equipados com motor Simca V-12 cilindros.

Beltoise e o Matra-BRM de 2 litros

Em 1966, passa a participar também da F-2, onde se sagraria campeão europeu de 1967, ano em que também venceria invicto a temporada argentina de 1967 de F-3.
Ainda em 1967 estréia na F-1 no GP do México com um sétimo lugar ao volante do Matra Simca de 12 cilindros, onde se firmaria a partir de 1968.

Fórmula Um, GP de Mônaco,1968

Em 69, divide a equipe com o Matra-Ford Cosworth de Jackie Stewart (que levantaria o título mundial), muito embora continuasse correndo com o motor Simca V-12 cilindros.
Apesar dos parcos resultados na F-1, com uma ou outra performance memorável, foi nos Sport-Protótipos que Beltoise firmou o seu nome com 12 vitórias no período de 1963 a 1979.

Matra 660, Le Mans, em dupla com Chris Amon

Beltoise foi um piloto marcado pela tragédia: após seu terrível acidente em Reims em 64, sua primeira esposa, Elaine, morreria num acidente de estrada ao volante de uma Matra Djet quando ia encontrá-lo nos testes da Matra 620 para as 24 Horas de Le Mans de 1966.
Viu também a grande promessa francesa, Roby Weber, morrer estupidamente num acidente na reta de Hunnadiére, ao volante de um Matra 620 equipado com motor Ford 4.7 oriundo de um GT-40.
Mas o pior episódio envolvendo seu nome ocorreria nos Mil Km de Buenos Aires de 1971, prova que havia vencido no ano anterior. Com pane seca e tentando chegar aos boxes empurrando a Matra MS650, cruzou irresponsavelmente duas vezes a pista, provocando o choque com a Ferrari dirigida por Ignazio Giunti, que explodiu em chamas matando o piloto italiano.
Responsabilizado pelo acidente, Beltoise teve a licença suspensa por seis meses, mas se recuperou em 1972 quando, ao volante de um BRM P160 venceu o GP de Mônaco, debaixo de um temporal e batendo os melhores pilotos da F-1.

Mônaco, 1972, escrevendo seu nome entre os grandes pilotos…
[youtube]22BKO0xm50U[/youtube]
…e complementando (Jovino do Planalto lembrou bem) vídeo da prova

Neste mesmo ano, outra vitória na F-1, a Corrida dos Campeões em Brands Hatch, prova extra-campeonato. Ano seguinte, 73, divide a equipe BRM com Niki Lauda e Clay Regazzoni, ali ficando até 1974.
Em 75, termina sua carreira na F-1 pela Ligier, dedicando-se a partir daí aos carros de Turismo, onde conseguiria três vitórias de BMW e Peugeot.
Nos Sport-Protótipos, vitória nas 24 Horas de Le Mans em 1976, com Inaltera-Ford, em dupla com Henri Pescarolo.
Paralelamente, disputou de 79 a 81 o campeonato francês de rallycross, sagrando-se campeão europeu de 1979, pilotando um Alpine-Renault.

A face de um campeão…

Pela versatilidade, talento, tenacidade e capacidade de recuperação, Jean Pierre Beltoise merece um lugar de destaque na galeria dos grandes pilotos de nossos tempos.

“É Proibido Morrer” é o título do livro lançado por Beltoise em 1968, onde conta o inicio de sua carreira até seu primeiro ano de F-1, um raro documento do automobilismo dos anos sessenta.

Joaquim, Joca, ou “Anexo J” do Boteco do Saloma
Ex-comissário desportivo da FIA, foi fundador, presidente e diretor técnico de kart clube, rali, arrancada e dirigente de federação de automobilismo.
Titular da coluna “Umas&Outras”, escreve regularmente neste espaço às segundas feiras.
(reprodução)

Luiz Salomão

Blogueiro e arteiro multimídia por opção. Dublê de piloto do "Okrasa" Conexão direta com o esporte a motor!

14 comentários em “"UMAS & OUTRAS" #20

  • 7 de julho de 2008 em 08:29
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    SENSACIONAL Juca. Essa coluna me pegou no contra-pé.

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  • 7 de julho de 2008 em 08:29
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    SENSACIONAL Juca. Essa coluna me pegou no contra-pé.

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  • 7 de julho de 2008 em 11:52
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    O que impressiona nas colunas do Mestre Joaquim é a sua originalidade. Eu podia esperar tudo mas esta coluna sobre o J.P.Beltoise me surpreende.
    Mestre Joca nos leva sempre a caminhos pouco conhecidos do automobilismo sempre com mão segura.
    Absolutamente perfeita a coluna.Parabéns, mais uma vez!

    Resposta
  • 7 de julho de 2008 em 11:52
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    O que impressiona nas colunas do Mestre Joaquim é a sua originalidade. Eu podia esperar tudo mas esta coluna sobre o J.P.Beltoise me surpreende.
    Mestre Joca nos leva sempre a caminhos pouco conhecidos do automobilismo sempre com mão segura.
    Absolutamente perfeita a coluna.Parabéns, mais uma vez!

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  • 7 de julho de 2008 em 13:16
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    Joaquim,
    Vi um video do Beltoise em mônaco debaixo de chuva que ele dá um verdadeiro show, acredito que seja este citado por você.
    Agora, a gente vê como a paixão por aquilo que se faz, no caso automobilismo, leva um piloto, mesmo em momento difícil após um sério acidente, pensar na continuidade da profisão quando pediu ao médico para imobilizar o braço em um ângulo que o permitisse voltar a pilotar após perde o movimento do cotovelo esquerdo e deixando-o dar prosseguimento ao que ele mais gostava de fazer.
    Abraço.
    Jovino

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  • 7 de julho de 2008 em 13:16
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    Joaquim,
    Vi um video do Beltoise em mônaco debaixo de chuva que ele dá um verdadeiro show, acredito que seja este citado por você.
    Agora, a gente vê como a paixão por aquilo que se faz, no caso automobilismo, leva um piloto, mesmo em momento difícil após um sério acidente, pensar na continuidade da profisão quando pediu ao médico para imobilizar o braço em um ângulo que o permitisse voltar a pilotar após perde o movimento do cotovelo esquerdo e deixando-o dar prosseguimento ao que ele mais gostava de fazer.
    Abraço.
    Jovino

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  • 7 de julho de 2008 em 15:34
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    Olá Saloma e todos!

    Sou fã do Joaquim e sua interminável cultura automobilística.

    Com relação à vitória em Le Mans 1976, gostaria de fazer um pequeno acréscimo, se me permitem:

    O vencedor na classificação geral das 24 Horas de Le Mans em 1976, foi o Porsche 936, pilotado por Jacky Ickx e Gijs van Lennep, (pertencente ao Grupo 6 acima de 2000cc) com 349 voltas.

    Beltoise e Pescarolo ao volante do Inaltera, venceram na categoria GTP(GT prototype), com 305 voltas, ficando em oitavo na classificação geral.

    Aliás, o Inaltera era um carro lindo, diga-se de passagem!! 🙂

    Um grande abraço a todos.

    Resposta
  • 7 de julho de 2008 em 15:34
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    Olá Saloma e todos!

    Sou fã do Joaquim e sua interminável cultura automobilística.

    Com relação à vitória em Le Mans 1976, gostaria de fazer um pequeno acréscimo, se me permitem:

    O vencedor na classificação geral das 24 Horas de Le Mans em 1976, foi o Porsche 936, pilotado por Jacky Ickx e Gijs van Lennep, (pertencente ao Grupo 6 acima de 2000cc) com 349 voltas.

    Beltoise e Pescarolo ao volante do Inaltera, venceram na categoria GTP(GT prototype), com 305 voltas, ficando em oitavo na classificação geral.

    Aliás, o Inaltera era um carro lindo, diga-se de passagem!! 🙂

    Um grande abraço a todos.

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  • 7 de julho de 2008 em 20:34
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    Mais uma segunda-feira aguardada ansiosamente e com a expectativa superada como sempre.

    Mestre Joaquim, PARABÉNS!

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  • 7 de julho de 2008 em 20:34
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    Mais uma segunda-feira aguardada ansiosamente e com a expectativa superada como sempre.

    Mestre Joaquim, PARABÉNS!

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  • 11 de julho de 2008 em 07:40
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    Tive a grata satisfação de conhecer o Beltoise nos treinos para o GP de Brasilia de 1974, inauguração do autódromo candango. Levei meu exemplar, de “É Proibido Morrer” para que ele o autografasse. Qual não foi sua surpresa ao saber que o livro havia sido lançado no Brasil em 1971!
    Isto rendeu um bom e grande papo naquele final de treinos de sábado, com revelações que vocês saberão numa coluna próxima, uma abordagem sobre os pilotos franceses jamais escrita no Brasil. Aguardem, pois…

    Resposta
  • 11 de julho de 2008 em 07:40
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    Tive a grata satisfação de conhecer o Beltoise nos treinos para o GP de Brasilia de 1974, inauguração do autódromo candango. Levei meu exemplar, de “É Proibido Morrer” para que ele o autografasse. Qual não foi sua surpresa ao saber que o livro havia sido lançado no Brasil em 1971!
    Isto rendeu um bom e grande papo naquele final de treinos de sábado, com revelações que vocês saberão numa coluna próxima, uma abordagem sobre os pilotos franceses jamais escrita no Brasil. Aguardem, pois…

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