"UMAS E OUTRAS"…(3)

A FÓRMULA FORD BRASILEIRA…PARTE UM
Por Joaquim Lopes

Alguns fatores contribuíram para o surgimento da Fórmula Ford no Brasil. Começando pela Fórmula Jr, passando pela natimorta Fórmula Gordini, o desastre do F-3 Gávea ou os mastondontes da Mecânica Continental, várias vezes foi tentada a criação de uma categoria nacional de monopostos.
Mas alguns desdobramentos impediram que isto ocorresse.
Primeiro, no início dos anos 60, com as equipes de fábrica presentes nas pistas, não havia interesse em apoiar uma categoria de monopostos sem maior identificação com os carros de série.
Segundo, o momento político, o golpe militar de 64 e seu programa econômico recessivo, não animavam nenhum investimento numa categoria sem tradição ou retorno imediato, sendo que mesmo as fábricas tinham dificuldade de vender seus produtos no mercado.
Terceiro, a estrutura arcaica do nosso automobilismo doméstico não privilegiava a criação de nenhuma categoria independente do apoio oficial das fábricas.
Mesmo assim, foi com alguma surpresa (e relutância da VW) que a Fórmula Vê 1200 aqui estreou em 1967, tornando-se logo um sucesso e uma grande esperança de profissionalização para nossos pilotos e construtores, mas no ano seguinte, com o fechamento de Interlagos para reformas, a Fórmula Vê transferiu-se para o Rio de Janeiro – único circuito fechado operante no Brasil naquela época – onde se transformou quase num fenômeno regional, a despeito de dois campeonatos brasileiros disputados em 67 e 68.
A Fórmula Vê sobreviveria até o final de 1969, mesmo sendo ameaçada pela criação da Fórmula Brasil – esta uma contrafação da Fórmula Vê com motores mais potentes e rodas mais largas – um tiro na água que nunca vingou além de umas poucas provas mistas com F-Vê e F-Ford, no início de 1970.
Em 1970, outros fatores mais objetivos concorreram para o surgimento da F-Ford brasileira. Primeiramente, o sucesso de Emerson Fittipaldi, Ricardo Achcar e Luis Pereira Bueno na categoria, no ano anterior.
Depois, a temporada brasileira de Fórmula Ford – o Torneio BUA – uma associação entre o ex-piloto Antonio Carlos Scavone e John Webb, proprietário do circuito de Brands Hatch e um dos criadores da categoria na Inglaterra, que, apesar dos problemas nas etapas do Rio de Janeiro e de Fortaleza, transformou a F-Ford num tremendo sucesso no Brasil.
Por último, mas não menos importante, a estrutura do automobilismo brasileiro começava a mudar, após décadas de letargia e atraso, proporcionando o surgimento de novas pistas, atraindo a atenção de promotores profissionais de corridas e um calendário mais ajustado à nova realidade das corridas no Brasil.
No Rio Grande do Sul, em 1970, o circuito de Tarumã é inaugurado como o mais moderno autódromo brasileiro e os gaúchos, cansados das corridas de estradas de carreteras, Simcas e JKs, procuram uma categoria mais moderna e competitiva.
Luis Antonio Greco vê aí sua grande chance, uma vez que já estivera por trás da criação da Fórmula Jr em 1962, da tentativa de estabelecer no Brasil a Fórmula Gordini (uma cópia nacionalizada da Fórmula R da Renault francesa), ou a F-3 com o Willys-Gávea, todos projetos fadados ao fracasso por vários motivos.
Greco costura um acordo com o Automóvel Clube do Rio Grande do Sul para a construção e venda de 20 monopostos para pilotos gaúchos com financiamento da Caixa Econômica estadual, mas, cobra criada nos meandros do nosso automobilismo, negocia com os cartolas a criação de um campeonato nacional, com apoio integral da Ford Brasil.
Projetar, construir e desenvolver um novo carro estava fora de questão, devido ao prazo exíguo; a saída então foi gabaritar (copiar, melhor dizendo) um já existente. A escolha recaiu sobre o Merlyn inglês, por duas simples razões: era um dos mais competitivos chassis da categoria e os brasileiros que correram lá fora já o conheciam de sobra.
Assim, foi fechado um acordo com a fábrica para produzir o carro aqui. Como padrão, o motor Corcel com kit Bino de 1.440 cc e cerca de 100 HP caiu como uma luva, já que era fabricado pelo próprio Greco na sua speed-shop paulista, a Bino-Samdaco.

O Bino-Ford de Sérgio Mattos

Mas havia questões mais prosaicas de produção a serem resolvidas. Greco convidou Emil Schmidt para instalar a linha de produção dentro das dependências da Bino-Samdaco. Existe um crédito que jamais foi dado na criação da Fórmula Ford brasileira e este é devido ao gordo Emil Schmidt, um veterano da indústria automobilística brasileira.
Com apenas dez funcionários e num período de seis meses, Emil estruturou toda as seções de construção e montagem de chassis, laminagem de carrocerias, preparação de motores, almoxarifado, e até moldes especiais para construção de algumas peças.
Se foi possível a Fórmula Ford no Brasil, uma grande parte deste mérito deve ser creditado a Emil Schmidt….
Mas com todo esforço, problemas naturais de importação de equipamentos e de linha de produção atrasaram a construção dos carros sendo que os primeiros só foram entregues em meados de 1971.

Interlagos, largada da segunda etapa do Brasileiro de 71

Vinte deles foram entregues ao Automóvel Clube do RS, três carros foram para SP (Lameirão, Delamare e Sérgio Mattos), um foi para o Distrito Federal (Alex Dias Ribeiro) e outro para Curitiba.

Leonel Friedrich e seu Titan em Interlagos

Assim, estavam lançados os dados para a primeira temporada da mais duradoura categoria monoposto do Brasil.
Mas isso é assunto para outra coluna …

Joaquim ou Joca ou “Anexo J”, do boteco…
“Ex-administrador de empresas, já foi um pouco de tudo na vida: bancário, vendedor, publicitário, jornalista, relações públicas, motorista de carreta, garçom, cortador de grama, pintor de paredes, técnico em manutenção de aviões. Já andou por garimpos e extraiu madeira na Amazônia, perambulou por Colômbia, Venezuela, Caribe, México, Estados Unidos, Canadá e Cuba em diversas atividades inconfessáveis. Hoje, aposentado, ocupa-se em alugar a paciência alheia escrevendo sobre automobilismo em blogs e sites especializados de amigos.”

(reprodução/fotógrafo – ROGÉRIO P.D. LUZ)

Luiz Salomão

Blogueiro e arteiro multimídia por opção. Dublê de piloto do "Okrasa" Conexão direta com o esporte a motor!

10 comentários em “"UMAS E OUTRAS"…(3)

  • 5 de março de 2008 em 18:54
    Permalink

    Como sempre um texto límpido,
    recheado de fatos, mas com o calor da emoção presente apenas naqueles que escrevem com paixão.

    Resposta
  • 5 de março de 2008 em 18:54
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    Como sempre um texto límpido,
    recheado de fatos, mas com o calor da emoção presente apenas naqueles que escrevem com paixão.

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  • 6 de março de 2008 em 07:41
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    Valeu mestre Joca!

    Uma verdadeira aula sobre o nascimento da F-Ford brasileira ,só tem um problema,agora fico roendo as unhas esperando a continuação.

    E como era bonito a pintura da equipe Cinzano !

    Resposta
  • 6 de março de 2008 em 07:41
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    Valeu mestre Joca!

    Uma verdadeira aula sobre o nascimento da F-Ford brasileira ,só tem um problema,agora fico roendo as unhas esperando a continuação.

    E como era bonito a pintura da equipe Cinzano !

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  • 6 de março de 2008 em 14:34
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    Olá, Mauricio e Jonni,

    Era um desejo antigo escrever sobre o nascimento da F-Ford e da F-Ford brasileira brasileira. Na próxima segunda vem o texto final sobre a categoria nacional. Claro que não há a menor preocupação em esgotar o assunto mas pelo menos vou “exorcizar” (hehehehe…)o assunto de minha memória.

    Grande abraço, aos dois.

    P.S. Maurico, “captei a mensagem” sobre a Copa Brasil. bela sugestão, vai sair o mais breve possível…

    Abs,

    Resposta
  • 6 de março de 2008 em 14:34
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    Olá, Mauricio e Jonni,

    Era um desejo antigo escrever sobre o nascimento da F-Ford e da F-Ford brasileira brasileira. Na próxima segunda vem o texto final sobre a categoria nacional. Claro que não há a menor preocupação em esgotar o assunto mas pelo menos vou “exorcizar” (hehehehe…)o assunto de minha memória.

    Grande abraço, aos dois.

    P.S. Maurico, “captei a mensagem” sobre a Copa Brasil. bela sugestão, vai sair o mais breve possível…

    Abs,

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  • 7 de março de 2008 em 22:06
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    Grande Joaquim,
    Sua matéria me fez lembrar de um grande piloto da formula ford, senão, o maior, o Clovis de Moraes, gaúcho que tocava muito.
    Apesar de todos os problemas que surgiam naquela época o automobilismo era feito com mais amor e dedicação dos profissionais envolvidos, por isto, o sucesso que tinha.
    Parabens e continue nos proporcionando momentos do seu vasto conhecimento automobilistico dos velhos e bons tempos.
    Jovino

    Resposta
  • 7 de março de 2008 em 22:06
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    Grande Joaquim,
    Sua matéria me fez lembrar de um grande piloto da formula ford, senão, o maior, o Clovis de Moraes, gaúcho que tocava muito.
    Apesar de todos os problemas que surgiam naquela época o automobilismo era feito com mais amor e dedicação dos profissionais envolvidos, por isto, o sucesso que tinha.
    Parabens e continue nos proporcionando momentos do seu vasto conhecimento automobilistico dos velhos e bons tempos.
    Jovino

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  • 7 de março de 2008 em 22:15
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    Grande Joaquim,
    Sua matéria me fez lembrar de um grande piloto da formula ford, senão, o maior, o Clovis de Moraes, gaúcho que tocava muito.
    Apesar de todos os problemas que surgiam naquela época o automobilismo era feito com mais amor e dedicação dos profissionais envolvidos, por isto, o sucesso que tinha.
    Parabens e continue nos proporcionando momentos do seu vasto conhecimento automobilistico dos velhos e bons tempos.
    Jovino

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  • 7 de março de 2008 em 22:15
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    Grande Joaquim,
    Sua matéria me fez lembrar de um grande piloto da formula ford, senão, o maior, o Clovis de Moraes, gaúcho que tocava muito.
    Apesar de todos os problemas que surgiam naquela época o automobilismo era feito com mais amor e dedicação dos profissionais envolvidos, por isto, o sucesso que tinha.
    Parabens e continue nos proporcionando momentos do seu vasto conhecimento automobilistico dos velhos e bons tempos.
    Jovino

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