"UMAS & OUTRAS, #23…

OS JOVENS LOBOS
Joaquim Lopes Filho

Quem se debruçar sobre a história do automobilismo mundial inevitavelmente vai se deparar com a aparente súbita ascensão dos pilotos franceses nos anos 70 e oitenta, culminando com os quatro campeonatos mundiais de Fórmula Um de Alain Prost, além de vários títulos nos sport-protótipos, ou nas fórmulas menores.
Uma análise mais apurada vai demonstrar que esta ascensão não se deu por acaso e sim foi fruto de um trabalho bem planejado com vistas a resultados em médio prazo.
Senão, vejamos…
É notório que lá pelos anos 30 e 40 as corridas internacionais eram dominadas por alemães e italianos onde pontificavam Auto Union e Alfa Romeo fortemente bancados e incentivados pelos governos nazista e fascista, respectivamente, que utilizavam as competições automobilísticas como prova de superioridade tecnológica.
Ingleses e franceses desempenhavam um papel secundário, mas não menos importante o que começaria a mudar nos anos do pós-guerra, quando as pequenas garagens inglesas começaram a virar o jogo a seu favor, principalmente nas pequenas fórmulas e carros esporte de baixa cilindrada.
Quanto aos franceses, suas maiores realizações ficaram no campo dos ralis ou subidas de montanha, com somente dois grandes nomes inscritos como pilotos de GP, Jean Behra e Maurice Trintignant, no final dos anos cinqüenta.
É no início dos anos 60 que começa a grande virada do automobilismo francês e, como de hábito, há sempre um componente político ou econômico envolvido.
O fato é que no final da década de cinqüenta a França encontrava-se em grave crise política e seriamente fragmentada devido à perda consecutiva de suas colônias na Indochina (atual Vietnã, Laos e Camboja, em 1954) e no norte da África (Argélia, 1959), terreno fértil para a implantação do nacionalismo exaltado de Charles de Gaulle, também conhecido como gaullismo.
Com resultado prático se inicia o apoio de companhias petrolíferas e estatais francesas no automobilismo de competição no início dos anos sessenta. Em termos de pilotos, o celeiro mais imediato são as competições de moto, terreno em que os franceses mantiveram-se competitivos ao longo dos anos e é daí que aparecem figuras como Henri Grandsire, Eric Offenstadt e Jean Pierre Beltoise, novos expoentes de uma geração que se chamaria de “os jovens lobos”.

Motociclismo, celeiro natural para busca de novos pilotos

Ao mesmo tempo há uma concentração de esforços na consolidação de pequenas e incipientes marcas como Alpine e Renne Bonnet, com forte apoio da Renault, principalmente quando da participação nas famosas 24 Horas de Le Mans.
Em 65, há uma grande reviravolta quando a Matra – integrante do grupo Marcel Dassault, maior fabricante de armas francês e fortemente subsidiado pelo governo – resolve investir no crescente mercado de carros esportivos, para tanto assumindo os ativos da falimentar Renné Bonnet.

Renné Bonnet, raízes da Matra Sport

O programa da Matra era, antes de tudo, muito ambicioso: em cinco anos ganhar a “tríplice coroa”, ou seja, o Mundial de Pilotos, Construtores e Le Mans. Para tanto, é chamado Jean Luc Ladargère, um engenheiro elétrico de pouca vivência nas pistas, mas de extraordinária capacidade de organização e liderança, que reuniu em volta de si os melhores nomes disponíveis para a empreitada, logo então apelidada por Enzo Ferrari como “ le bande du fous” (o bando de tolos…)
Paralelamente ao programa da Matra (que merece uma coluna à parte…) institui-se programas de incentivo à formação de pilotos como o Volante Shell – que garantia ao vencedor uma temporada completa de Fórmula Três – e a Fórmula Renault.
Os primeiros pilotos a juntarem-se à Matra foram Eric Offenstadt (que não ficaria na equipe), Jean Pierre Beltoise (vindo da Renné Bonnet), Henri Pescarolo ( do time Renault) e Jean Pierre Jaussaud. Roby Weber e Johnny Servoz-Gavin se juntariam a eles mais tarde, tanto no programa de fórmulas como nos sport-protótipos.

O Team Matra: Beltoise. Pescarolo, Servoz-Gavin e Jaussaud

Ao mesmo tempo a Alpine Renault concentra-se mais nas provas de rali e nas de longas distâncias, como o Tour de France, ou disputando vitórias na classe nos “índices energéticos”, títulos de certa importância nas corridas de longo curso daquela época.
O trabalho rende dividendos rapidamente e somente três anos depois, 1968, a Matra já vence o Campeonato Europeu de F-2 com Jean Pierre Beltoise e, no ano seguinte o Mundial de Pilotos, através da equipe de Ken Tyrrel e garantindo o primeiro título de Jackie Stewart, muito embora com motor Ford-Cosworth.

Domínio francês na F-2, 1969…

… e o título mundial com Stewart e o MS80/Ford

Ainda em 1968, a Alpine Renault consegue vitória majoritária na Coupe des Alpes, culminando com um fantástico 1-2-3 no prestigiado Rali de Monte Carlo, já em 1971.
O início dos anos setenta apresenta uma quantidade considerável de pilotos franceses alinham nos grids das fórmulas inferiores e nos campeonatos de sport protótipos: François Mazet, Jean Pierre Jabouille, Jean Pierre Jarrier, François Cevert, Patrick Depailler, Jacques Lafitte, para citar alguns.

Alpine-Renault em Le Mans, 1969

Em 1972 a Matra finalmente consegue seu intento de vencer em Le Mans com o modelo MS670 pilotado por Henri Pescarolo e Grahan Hill. O mesmo resultado e repetiria no ano seguinte com o mesmo Pescarolo em dupla com Gerard Larrousse. Atingido seus objetivos a Matra se retira das competições no ano seguinte.

Finalmente, Matra vence em Le Mans, 1972

Esta geração de ouro francesa iria pavimentar o caminho para a seguinte, a dos anos oitenta, que teve entre seus expoentes Didier Pironi, René Arnoux, Patrick Tambay, e seu destaque maior, o multicampeão Alain Prost.

Prost, no início, ainda no kart…

Com a saída de cena deste último e com a grande exposição da Fórmula Um como categoria máxima, a despeito de outros pilotos talentosos, houve um decréscimo de grandes pilotos franceses, exceção feita aos sport-protótipos onde dominam com uma certa facilidade. É conhecida por alguns periódicos franceses como “a geração perdida”.
Quando virá a próxima legião de vencedores? É a pergunta que não quer calar…

Joaquim, Joca, ou “Anexo J” do Boteco do Saloma
Ex-comissário desportivo da FIA, foi fundador, presidente e diretor técnico de kart clube, rali, arrancada e dirigente de federação de automobilismo.
Titular da coluna “Umas&Outras”, escreve regularmente neste espaço às segundas feiras.
(reprodução)

Luiz Salomão

Blogueiro e arteiro multimídia por opção. Dublê de piloto do "Okrasa" Conexão direta com o esporte a motor!

24 comentários em “"UMAS & OUTRAS, #23…

  • 28 de julho de 2008 em 11:24
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    parabéns pelo artigo! é muito interessante ler sobre a história do automobilismo e não ficarmos só apegados às novidades tecnológicas!
    abraços!

    Resposta
  • 28 de julho de 2008 em 11:24
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    parabéns pelo artigo! é muito interessante ler sobre a história do automobilismo e não ficarmos só apegados às novidades tecnológicas!
    abraços!

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  • 28 de julho de 2008 em 12:54
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    Saloma, tudo certo?Eu precisava de uma ajuda. Eu tô fazendo um trabalho pro Ingo Hoffmann e precisava de uma foto de um opala que ele correu em 1986 com patrocínio metalpó. Nem ele mesmo tem essa foto, será que vc não tinha alguma por aí?Marcos Gracia foi o campeão naquele ano!!Abraços e fico no aguardo!!

    Resposta
  • 28 de julho de 2008 em 12:54
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    Saloma, tudo certo?Eu precisava de uma ajuda. Eu tô fazendo um trabalho pro Ingo Hoffmann e precisava de uma foto de um opala que ele correu em 1986 com patrocínio metalpó. Nem ele mesmo tem essa foto, será que vc não tinha alguma por aí?Marcos Gracia foi o campeão naquele ano!!Abraços e fico no aguardo!!

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  • 28 de julho de 2008 em 15:04
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    Joaquim, será que estes formulas 2 tinham controle de dentro do carro para moverem estes aerofólios? Coisa de doido,pois parecem serem muito frágeis. Agora, o Alpine é lindo.
    Bela matéria.
    Jovino

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  • 28 de julho de 2008 em 15:04
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    Joaquim, será que estes formulas 2 tinham controle de dentro do carro para moverem estes aerofólios? Coisa de doido,pois parecem serem muito frágeis. Agora, o Alpine é lindo.
    Bela matéria.
    Jovino

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  • 28 de julho de 2008 em 16:36
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    Cara seu blog é muito bom, alem de história e cultura é muito bem escrito, realmente estão de parabens, o Interney está se tornando cada vez mais forte na internet por blogs como o seu, uma duvida aqui, eu estou querendo comprar um carro e vi na pagina de carros novos do icarros um gol zero 2009 1.0 por R$ 26.930,00 acho que é no mesmo preço das concessionarias com menos incomodo e você?

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  • 28 de julho de 2008 em 16:36
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    Cara seu blog é muito bom, alem de história e cultura é muito bem escrito, realmente estão de parabens, o Interney está se tornando cada vez mais forte na internet por blogs como o seu, uma duvida aqui, eu estou querendo comprar um carro e vi na pagina de carros novos do icarros um gol zero 2009 1.0 por R$ 26.930,00 acho que é no mesmo preço das concessionarias com menos incomodo e você?

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  • 28 de julho de 2008 em 19:16
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    É, acho que o último dos moicanos, que apagou a luz, foi o Jean Alesi mesmo… e pelo jeito vão demorar para chegar num nível como dos 70 e 80… o menino com sobrenome de tenista, o Grosjean, ainda não vi nada tão espetaculoso assim…

    Essa trupe dos anos 70 era o bicho mesmo e curioso notar que, nos anos 80, a França tava na crista da onda, porque nos gramados tinha a trupe de Platini mandando ver bonito e nas pistas tinha a trupe de Prost, Arnoux, Pironi e cia sentando a bota… questão de fase mesmo…

    Mas acho que muito dessa falta de pilotos franceses de ponta passa pelo fim daquele projeto de formação da Elf… se bem que nos dias atuais é difícil alguma empresa bancar algo do gênero… e os franceses sofrem o que aqui no Brasil também se pena…

    E para variar, beleza de artigo, mestre Joa!

    Resposta
  • 28 de julho de 2008 em 19:16
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    É, acho que o último dos moicanos, que apagou a luz, foi o Jean Alesi mesmo… e pelo jeito vão demorar para chegar num nível como dos 70 e 80… o menino com sobrenome de tenista, o Grosjean, ainda não vi nada tão espetaculoso assim…

    Essa trupe dos anos 70 era o bicho mesmo e curioso notar que, nos anos 80, a França tava na crista da onda, porque nos gramados tinha a trupe de Platini mandando ver bonito e nas pistas tinha a trupe de Prost, Arnoux, Pironi e cia sentando a bota… questão de fase mesmo…

    Mas acho que muito dessa falta de pilotos franceses de ponta passa pelo fim daquele projeto de formação da Elf… se bem que nos dias atuais é difícil alguma empresa bancar algo do gênero… e os franceses sofrem o que aqui no Brasil também se pena…

    E para variar, beleza de artigo, mestre Joa!

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  • 28 de julho de 2008 em 19:28
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    Como sempre , o texto impecável , as informações , as fotos …tudo . Um abraço para o dono dono do Boteco e o para o gerente do Anexo J .

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  • 28 de julho de 2008 em 19:28
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    Como sempre , o texto impecável , as informações , as fotos …tudo . Um abraço para o dono dono do Boteco e o para o gerente do Anexo J .

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  • 28 de julho de 2008 em 19:41
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    Number One, Joca, vc. é o cara!Pô meu, aparece.
    abs.

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  • 28 de julho de 2008 em 19:41
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    Number One, Joca, vc. é o cara!Pô meu, aparece.
    abs.

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  • 28 de julho de 2008 em 20:14
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    Antonio, o que posso lhe dizer que não importa que seja concessionaria ou não, acho que sempre tem aquela fila de espera, ainda mais sendo produto novo e já com nome em mercado.
    Dú, ele aparece no próximo GP Café, nem que for a porrete…

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  • 28 de julho de 2008 em 20:14
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    Antonio, o que posso lhe dizer que não importa que seja concessionaria ou não, acho que sempre tem aquela fila de espera, ainda mais sendo produto novo e já com nome em mercado.
    Dú, ele aparece no próximo GP Café, nem que for a porrete…

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  • 28 de julho de 2008 em 20:21
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    Holy Shit !!!
    De que baú mágico o Mestre Joca tira essas matérias? Nunca, em lugar nenhum li nada parecido com este artigo sobre os pilotos franceses.
    Só aqui mesmo no boteco do Sahib Saloma e com o tempero do Mestre Joaquim.
    Parabéns é pouco!

    Resposta
  • 28 de julho de 2008 em 20:21
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    Holy Shit !!!
    De que baú mágico o Mestre Joca tira essas matérias? Nunca, em lugar nenhum li nada parecido com este artigo sobre os pilotos franceses.
    Só aqui mesmo no boteco do Sahib Saloma e com o tempero do Mestre Joaquim.
    Parabéns é pouco!

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  • 29 de julho de 2008 em 08:50
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    Mestre Joca, só pra variar grande artigo !!!
    Esperamos vc no domingo, no Paddock da Hungria…rsss
    Abrs

    Resposta
  • 29 de julho de 2008 em 08:50
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    Mestre Joca, só pra variar grande artigo !!!
    Esperamos vc no domingo, no Paddock da Hungria…rsss
    Abrs

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