HISTÓRIA – EQUIPE JOLLY E SUAS ALFAS

Por Carlos de Paula 

Durante os anos 20 a 50 a Alfa Romeo teve um papel muito importante no automobilismo mundial. De fato, após a Segunda Guerra Mundial a Alfa-Romeo dominou a F-1 nos primeiros anos, mas decidiu abandonar as pistas após 1951. No Brasil, a Alfa já tinha um belo histórico de vitórias, inclusive o grande triunfo de Pintacuda na Gávea, batendo o piloto alemão Hans Stuck com o Auto-Union, em 1936. Alguns monopostos da marca ficaram no Brasil, sendo mais tarde utilizados na Mecânica Continental até a década de 60.
Salvo por uma mal fadada tentativa na categoria esporte, com o Disco Volante, a Alfa-Romeo praticamente desapareceu do automobilismo mundial de primeira linha, durante grande parte dos anos 50 e começo da década de 60. Exceto por participações de carros de turismo da fábrica na Mille Miglia, era raro ver Alfas em corridas importantes.
 
Alfas Zagato e Giulia em Interlagos, 1966
 
Alfas Giulia nas primeiras posições de largada estilo Le Mans em Interlagos, 1966
O italiano Emilio Zambello já se iniciara no automobilismo brasileiro nos anos 50, chegando a correr nas Mil Milhas de 1957 com uma carretera Fiat, em dupla com Ruggero Peruzzo, obviamente sem grandes condições de bater carros bem mais potentes: chegaram em 10° lugar. Em 1960 a Alfa-Romeo viria a ressurgir de forma estrondosa no automobilismo brasileiro, embora com nome diferente. A FNM lançara em 1960 um carro de luxo, que foi dado o nome JK. Esse carro era fabricado pela Alfa-Romeo na Itália em meados da década de 50 e, atipicamente, de grande porte. No Brasil o JK era o carro mais moderno, potente e caro, entre outras coisas, com câmbio de cinco marchas. Ao estrear nas pistas, o JK saiu ganhando da cara. As vitórias foram muitas, entre 1960 e 62, nas principais corridas do país, inclusive nas Mil Milhas, 24 Horas de Interlagos e a primeira edição dos 1000 km de Brasília.
 
Alfa GTA 25…
Entre os pilotos que usaram JK na época estava Emilio Zambello, que eventualmente substituiu os JK por outros modelos de Alfa-Romeo italianos, usados por Zambello em corridas de carreteras e de carros turismo. Entre outras, usou a Alfa Zagato, a Alfa Giulia e Giulietta. Zambello acabou dono da concessão de venda das Alfas importadas no Brasil, que chamou de Jolly, em homenagem à grande escuderia/clube italiano, e passou a usar o automobilismo de competição para promover seus produtos.
 
Alfa Giulia contra Carretera do Damiani Interlagos, 1965
Piero Gancia era outro italiano, herdeiro da Martini-Rossi, que vivia no Brasil. Os dois peninsulares acabaram juntando forças, e formando a equipe Jolly Gancia. No início, os carros eram tocados pelos dois “gentlemen drivers”, durante a época em que dominavam as corridas as três equipes de fábrica, a Willys, Vemag e Simca. Eventualmente, passaram a contratar pilotos profissionais, entre os melhores da época.
 
Variedade de Alfas da Jolly: GTA, Zagato e Giulia, 1967
Na Europa, a Alfa-Romeo voltava pouco a pouco ao automobilismo. Primeiro com a TZ, carro da categoria GT, e logo foi lançada a série Giulia. Com a criação do campeonato Europeu de Turismo, em 1963, a Alfa viu uma oportunidade certeira de voltar a brilhar nas pistas. O engenheiro Carlo Chiti, ex-Ferrari, que havia abandonado a Scuderia em 1962, e participado do fracassado projeto ATS, formara a Autodelta, que acabou convidada pela Alfa-Romeo a ser, efetivamente, seu departamento de competições. Esta passou a dar um tratamento especial às Alfas de turismo, e algumas destas Alfas bem preparadas foram chegando ao Brasil.
Nessa fase inicial, as Alfas ainda não eram os carros mais rápidos do país, perdendo para os Alpine, KG-Porsche, Malzonis, Simca-Abarth e algum ou outro especial que aparecia, como o Fitti-Porsche, a até mesmo a carretera 18 de Camilo Cristófaro. Mesmo sem ser os carros mais rápidos, as Alfas preparadas pelo especialista Giuseppe Perego eram muito resistentes, e como as corridas da época eram longas, Piero Gancia acabou se tornando campeão brasileiro de 1966, e de quebra, ganhou o primeiro Ranking Brasileiro de Pilotos promovido pela revista Auto-Esporte, em 1967.
 
Pace com a GTA 1600, 1969
As quadradinhas Giulias eventualmente deram lugar às rapidíssimas Alfas GTA e GTAM, que tanto furor fizeram no ETC, ganho por Andrea de Adamich em 1966 e 67. Aí iniciou-se uma fase de ouro para a Equipe Jolly, que com o fechamento da Dacon e das três equipes de fábrica (apesar de uma participação básica da Ford) praticamente ficara sem concorrentes. Além dos gentlemen Zambello e Gancia, um bom número de pilotos correu com as cores da Jolly: Wilson Fittipaldi Jr., Chico Lameirão, Pedro Victor de Lamare, Ubaldo Cesar Lolli, Marivaldo Fernandes, Totó Porto, José Carlos Pace, Tite Catapani, Mario Olivetti, Luis Fernando Terra Smith e outros. A Jolly ganhou muitas corridas na época, esporadicamente perdendo para o Protótipo Bino, ou numa tarde inspirada, para os BMW. Uma geração inteira acostumou-se com deliciosas fotos de Alfas GTA’s com duas rodas fora do chão, correndo nos poucos autódromos e circuitos de rua do país, e às vezes em estradas, como na Prova Rodovia do Café.
 
Marivaldo com a Alfa P33 em Curitiba, 1969. Outras Alfas da Jolly na formação de grid  à esquerda: a 23 a 25…
Infelizmente a época de ouro da Jolly, uma equipe paulista, coincidiu com o fechamento da pista de Interlagos para reformas, entre 1968 a 1969. Interlagos deixou de presenciar um dos mais fabulosos carros que correram no Brasil até aquela época: a Alfa P33 vermelha, o mesmo carro que chegara em 4° lugar em Le Mans em 1968. Com esse carro de 2 litros, José Carlos Pace e Marivaldo Fernandes ganharam muitas corridas em 1969, revezando-se na condução do bólido. Cabe lembrar que nessa época já corriam aqui uma Lola T70 de cinco litros e um Ford GT 40.
Além da P-33, as Alfas GTA 23, 25 e 27 continuaram a correr como coadjuvantes, acumulando bons resultados para a Jolly, que se tornou campeã brasileira mais uma vez, desta feita com José Carlos Pace. Foi num treino em Interlagos, entretanto, que a P-33 acabou destruída por Marivaldo, e em 1970 a Jolly voltou a usar suas GTA e a recém chegada GTAM de 2 litros. Pace se fora para a Europa correr na F3, e entre outros a Jolly teve como pilotos os dois irmãos herdeiros do Pão de Açucar, Abílio (pai de Pedro Diniz) e Alcidez Diniz. Além das vitórias de Marivaldo/Zambello, nos 1000 km de Brasilia, e de Catapani/Gancia nos 250 km, foram os Diniz os responsáveis pelas duas últimas grandes vitórias da Jolly: as Mil Milhas de 1970 e as 12 Horas de Interlagos de 1971. De fato, Abílio chegou à última corrida do campeonato de 1971 com chances de se sagrar campeão brasileiro, mas acabou cedendo o título (e o vice) para a dupla da Hollywood, Lian Duarte e Chico Lameirão.
 
Alfa GTAM nas 6 Horas de Interlagos, 1971
Em 1972, a face do automobilismo brasileiro estava mudada. As corridas de longa distância deixaram de ser realizadas naquele ano, e a Equipe Hollywood dominava as “sprints” com seu Porsche 908/2 e a Lola T210. Surgiam também muitos ágeis protótipos brasileiros, como Avallone, Casari, Heve, etc. na Divisão 4, e o campeonato de carros turismo, a Divisão 3, era limitado para carros brasileiros. Ou seja, as Alfa GTA e mesmo a GTAM não eram mais competitivas para vitórias gerais, não podiam correr nas provas de turismo, e desapareceram das pistas. A Jolly ainda participou dos 500 KM de Interlagos com uma Alfa T33, com Marivaldo Fernandes, chegando em 4° lugar, mas no fim do ano os carros estrangeiros de competição foram proibidos de correr no Brasil, efetivamente acabando com a Jolly.
Como concessionária Alfa-Romeo, e eventualmente Fiat, a Jolly ainda chegou a patrocinar alguns Alfa 2300 e Fiat em corridas de Divisão 1. Em 1978, Jose Rubens Romano ganhou quatro provas de Divisão 1, com um Fiat 147 patrocinado pela Jolly/Vasp. As GTA continuam a correr no Brasil até hoje, entretanto. Diversos dos principais protagonistas do Campeonato de Carros Clássicos são Alfas GTA com roupagem mais nova.
Algumas das principais vitórias da Equipe Jolly:
  • 1965
  • – 3 Hrs de Velocidade – Emilio Zambello – Alfa Giulia
  • 1966
  • – 1000 km Brasilia – Piero Gancia/Marivaldo Fernandes – Alfa Giulia
  • – 24 Horas Interlagos – Emilio Zambello/Ubaldo Cesar Lolli – Alfa Giulia
  • 1967
  • – 3 Horas de Velocidade – Piero Gancia – Alfa GTA
  • – 300 km Goiania – Ubaldo Cesar Lolli – Alfa Giulietta SZ
  • Premio Ney Braga – Piero Gancia – Alfa GTA
  •  
  • 1968
  • – 1000 km da Guanabara – Francisco Lameirão/Wilson Fittipaldi Jr. – Alfa GTA
  • – Prova Rodovia do Café – Ubaldo Cesar Lolli – Alfa GTA
  • – 500 km Guanabara – Francisco Lameirão/Emilio Zambello – Alfa GTA
  • – GP Jaime Pimentel – Piero Gancia – Alfa GTA
  • 1969
  • – 1000 km Brasilia – Jose Carlos Pace/Marivaldo Fernandes – Alfa GTA
  • – 3 Hrs Rio de Janeiro – José Carlos Pace – Alfa P-33
  • – 500 km Salvador – José Carlos Pace/Marivaldo Fernandes – Alfa P-33
  • – Curitiba – José Carlos Pace – Alfa P-33
  • – GP Costa e Silva – Emilio Zambello Alfa GTA 1900
  • – Porto Alegre – Emillio Zambello – Alfa GTA 1900
  • – GP Fortaleza – Marivaldo Fernandes/Luis F. Terra Smith – Alfa GTA
  • 1970
  • – Mil Milhas Brasileiras – Abilio Diniz/Alcides Diniz – Alfa GTAM
  • – 250 Milhas de Interlagos – Tite Catapani /Piero Gancia– Alfa GTA
  • – 1000 km Brasilia – Marivaldo Fernandes/Emilio Zambello – Alfa GTA
  • – Interlagos – Piero Gancia/J. R. Catapani – Alfa GTA
  • 1971
  • – 12 Horas de Interlagos – Abilio Diniz/Alcides Diniz – Alfa GTAM
Agradecimento especial ao Carlos De Paula, por disponibilizar seu conteúdo para o boteco…
(reprodução)

Luiz Salomão

Blogueiro e arteiro multimídia por opção. Dublê de piloto do "Okrasa" Conexão direta com o esporte a motor!

Um comentário em “HISTÓRIA – EQUIPE JOLLY E SUAS ALFAS

  • 9 de dezembro de 2012 em 18:28
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    Salomão, parabéns pela belíssima homenagem.

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